Alvo de um dos mais recentes movimentos do governo federal para
impulsionar o desempenho do país, o setor imobiliário figura como uma
das apostas da presidente Dilma Rousseff para colocar a economia de
volta nos trilhos, mas o segmento pode ver nos preços elevados um fator
limitador do crescimento no próximo ano.
"A principal questão gira em torno de preços e da dificuldade das
famílias comprarem um imóvel que caiba no orçamento", afirmou a
economista Ana Maria Castelo, da Fundação Getulio Vargas (FGV).
"A decisão de compra pode ser adiada com o consumidor à espera de
estabilização (de preços), já que a inadimplência alta vem resultando em
menor renda disponível", acrescentou a economista.
Embora o consumo no país tenha começado a se recuperar na segunda
metade de 2012, após sofrer desaceleração generalizada desde o fim de
2011, a população se encontra diante de um cenário de alto endividamento
e inadimplência em patamares elevados, resultando em maior cautela e
numa possível inibição da demanda no mercado imobiliário.
Segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) em parceria
com o Ibope, 60% da população brasileira pretende reduzir o consumo
porque teme uma retração da economia. Também conforme a CNI, 41% das
pessoas possuem dívidas, sendo que 42% delas já alcançaram o limite de
comprometimento do orçamento.
"Uma questão para a qual não está se dando importância é o nível de
endividamento muito elevado da população", disse o presidente do
sindicato da habitação na capital paulista, Secovi-SP, Cláudio
Bernardes, para quem o desempenho do setor imobiliário está diretamente
ligado ao crescimento da economia "Se a economia vai bem, o mercado
imobiliário vai bem também."
Estímulo ao setor
O índice FipeZap de preços de imóveis anunciados no Brasil avançou
13,8% nos 12 meses até novembro de 2012, após quase dobrar nos últimos
três anos.
Ainda que representantes do setor sejam unânimes em afirmar que os
preços de imóveis não caem, as recentes medidas de incentivo divulgadas
pelo governo podem contribuir para que eles parem de subir.
O governo divulgou no início de dezembro um pacote de medidas para a
construção civil, que incluiu desoneração da folha de pagamento, redução
de impostos e linha de capital de giro com taxas de juros mais baixas.
Tais medidas tendem a se refletir principalmente em menor pressão de
custos para as construtoras, que vêm lutando para equacionar estouros de
orçamento causados, em grande parte, pela escassez de mão de obra
qualificada.
"As empresas, que repassavam o aperto de margens no preço, poderão
praticar valores mais competitivos", disse o analista Wesley Bernabé, do
BB Investimentos. "Os preços não devem cair, mas podem ficar estáveis."
Apesar de serem apontadas como positivas para o setor, as medidas
apresentadas --e ainda não detalhadas-- resultaram em incertezas entre
agentes do setor que não conseguem dimensionar o real impacto para as
empresas e para o mercado como um todo.
Umas das principais dúvidas envolve a desoneração em folha também para
terceirizados, visto que muitas construtoras recorrem a essa opção para
driblar problemas com a mão de obra.
"Muitos pontos ainda não estão claros, ainda falta um detalhamento... E
o impacto (das medidas) não vai ser imediato", acrescentou Bernabé,
lembrando que o setor opera em ciclos longos, de até 36 meses.
Para o professor titular do núcleo de Real Estate da Escola Politécnica
da USP, João da Rocha Lima Jr., a desoneração é a principal medida,
garantindo redução de custos às construtoras e incorporadoras.
"A questão é saber se essa economia vai se transformar em (redução de)
preço. O mais razoável é esperar que resulte em melhoria da qualidade
dos imóveis, com os preços se mantendo", disse ele.
Ainda para mitigar a contenção da demanda pelos preços elevados dos
imóveis, pesquisa Reuters mostrou que sete de 10 analistas consultados
esperam aumento do teto para compra de residência com uso do Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), atualmente em R$ 500 mil. As
estimativas variaram de R$ 600 mil a R$ 750 mil --alta entre 20% e 50%.
Minha Casa, Minha Vida
O programa "Minha Casa, Minha Vida" --uma das principais bandeiras do
governo-- vem deixando para trás os entraves que fizeram com que
demorasse para entrar efetivamente em operação, embora os números para a
população que ganha até R$ 1.600 --a chamada faixa 1-- ainda preocupem.
A segunda etapa do programa, anunciada em junho de 2011, prevê 2,4
milhões de moradias contratadas até 2014, sendo metade do volume para
famílias que ganham até três salários mínimos. Até agora, foram
contratadas 1 milhão de unidades na segunda fase, sendo menos de um
terço voltado à primeira faixa de renda.
Isso porque, apesar de o governo ter elevado recentemente o valor
máximo para as contratações na faixa 1 em cerca de 15,6%, para R$ 76
mil, a construção de moradias nas principais capitais por esse valor
ainda é considerada inviável.
"Os grandes centros urbanos não têm conseguido viabilizar unidades na
faixa 1", disse o presidente do Sindicato da Indústria da Construção
Civil no Estado de São Paulo (SindusCon-SP), Sergio Watanabe.
"Essa faixa vem sendo viabilizada nas pequenas cidades e regiões
periféricas... Mas o maior problema de déficit habitacional está nas
grandes cidades", alertou Watanabe.
(A Reuters publica uma série de matérias especiais sobre as perspectivas para o Brasil em 2013 e 2014)
(Edição de Cesar Bianconi e Raquel Stenzel)
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