O que pesar antes de assumir uma dívida tão longa?
O alto preço dos imóveis, principalmente nas
capitais brasileiras, tem feito muita gente acreditar que será
impossível comprar a casa própria sem se endividar por 20 ou 30 anos.
Mas durante esse período, muita coisa pode mudar, tanto na região onde
fica o imóvel desejado quanto na vida do comprador. Quanto maior o
prazo, mais difícil é tentar fazer uma previsão.
Será que um financiamento tão longo é o mais adequado para você?
Será que um financiamento tão longo é o mais adequado para você?
Antes de assumir um compromisso tão longo é preciso
pesar uma série de prós e contras e tomar muitos cuidados. Veja a
seguir o que você deve ponderar antes de entrar numa dívida como essa, e
que características o imóvel deve ter para você não ter problemas no
futuro.
Você não está preso ao financiamento ou ao imóvel por 30 anos
Financiar um imóvel por 30 anos é um compromisso
repleto de incertezas. Nesse meio tempo, a região onde o imóvel está
localizado pode mudar radicalmente, você pode casar ou se divorciar, ter
filhos, seus pais podem ir morar com você depois de aposentados, seus
filhos podem sair de casa, você ou alguém da sua família pode falecer,
ficar doente ou desempregado, e assim por diante.
Essa questão pode apavorar quem pensa em assumir um
financiamento, mas nem mesmo esse tipo de compromisso é um caminho sem
volta. Primeiro porque você pode amortizar o seu financiamento a
qualquer momento com seus recursos próprios, ou a cada dois anos com o
seu FGTS.
“Só porque você pegou crédito por 30 anos não
significa que você terá que pagar durante 30 anos”, diz Marcelo Prata,
CEO da consultoria de crédito imobiliário Canal do Crédito. É claro que
quanto menor o tempo de financiamento, menos juros você paga. Mas quando
você amortiza o saldo devedor, os juros referentes à quantia amortizada
deixam de ser cobrados.
Outra alternativa, um pouco mais complicada, mas
factível, é vender o imóvel no meio do financiamento, passando a dívida
adiante. O comprador toma um novo financiamento, quita a sua dívida e
fica com um financiamento no nome dele, desonerando você completamente.
Caso o governo consiga aprovar regras melhores para a portabilidade de
financiamentos imobiliários – hoje muito custosa em função dos gastos
cartoriais –, esse processo se tornará ainda mais simples, diz Marcelo
Prata.
Mas ele alerta: “Nunca faça contrato de gaveta”. O
contrato de gaveta entre vendedor e comprador faz com que este assuma o
pagamento da dívida do vendedor, que, no entanto, continua com o
financiamento em seu nome. Caso o comprador deixe de pagar alguma
parcela, quem vendeu o imóvel é quem vai ter que arcar com as
consequências. O risco, portanto, é grande.
Como é o entorno do imóvel?
Para José Luiz Monteis, diretor-superintendente da
Cia. Inteligência e Coordenação, que atua no mercado imobiliário, a
análise do entorno é primordial quando se está escolhendo um imóvel para
financiar em um prazo tão longo. Mesmo que você não vá morar no local
por 20 ou 30 anos, é possível que futuramente você queira alugá-lo para
depois se mudar para outro lugar.
“Algumas áreas podem causar preocupação no futuro,
como locais que ainda estão se desenvolvendo, onde há crescimento
imobiliário. Por exemplo, galpões e imóveis industriais que ainda possam
ser derrubados para darem lugar a novos imóveis, favelas que possam
crescer ou terrenos que ainda aguardem construção”, diz Monteis,
lembrando que essas mudanças podem afetar o perfil do bairro, a
insolação do imóvel ou a vista, por exemplo.
Por isso, bairros onde o zoneamento urbano já está
definido, onde não há mais expansão e que são mais residenciais são mais
seguros, nesse sentido. Além disso, se você pretende algum dia alugar o
imóvel, prefira boas localizações, bem servidas de transporte público e
próximas a centros comerciais, o que é crucial para os locatários nas
grandes cidades.
Lembre-se de que se você ainda é jovem e decide
entrar em um financiamento longo logo no início da carreira, você corre o
risco de travar a sua mobilidade para aproveitar oportunidades
profissionais em bairros ou cidades distantes. “Neste caso, prefira um
imóvel que tenha boa liquidez e que seja alugado facilmente, como um
apartamento mais padrão de dois quartos. Se você precisar deixá-lo
amanhã, pelo menos terá como repassar o financiamento ou pagar as
parcelas com o aluguel com certa facilidade”, diz Marcelo Prata.
Você é avesso a tomar crédito?
Marcelo Prata lembra que algumas pessoas são
realmente avessas a crédito. “Por mais que ela esteja trocando o aluguel
por uma parcela do financiamento, seus hábitos são de poupador, e isso
independe da faixa etária”, diz Prata. Para ele, neste caso, o melhor é
mesmo poupar e vender bens, como um carro, para tentar comprar à vista
mesmo. “Essas pessoas sofrem com os juros, independentemente de quanto
sejam. Melhor andar a pé por algum tempo do que tomar crédito”,
acredita.
Você está numa situação de vida estável?
Segundo Marcelo Prata, muita gente associa a compra
de um imóvel a uma grande mudança na vida, como um casamento, uma união
estável, uma promoção ou uma mudança de emprego. Mas isso pode ser um
erro se a pessoa assumir um financiamento muito longo sem estar
preparada.
“Você já está passando por uma grande mudança. Não
sabe se vai estar apto a assumir a incerteza de um financiamento de 20
ou 30 anos. Neste caso, é melhor estabilizar a vida profissional
primeiro, para depois tomar uma decisão de longo prazo”, diz o CEO do
Canal do Crédito.
Ele dá o exemplo do casal jovem que resolve sair da
casa dos pais para casar ou morar junto sem ter tido a experiência de
morar só. “Essas pessoas ainda não têm noção dos custos de morar
sozinhos e já vão assumir a parcela de um financiamento? É melhor
esperar uns três ou cinco anos para saber como ficará o orçamento antes
de se endividar. Claro que se as duas pessoas já são maduras, se
estabilizaram profissionalmente e moram sozinhas, é muito mais tranquilo
entrar em um financiamento”, explica.
Um financiamento longo é mesmo a melhor alternativa para você?
O economista Luiz Calado, autor do livro “Imóveis –
Seu guia para fazer da compra e venda um grande negócio”, lembra que,
em financiamentos muito longos, pagam-se mais juros. Além disso, no
início o comprador paga mais juros do que efetivamente o valor do
imóvel, pois a maior parte da parcela é composta pelo valor referente
aos juros.
“Não necessariamente financiar é a melhor coisa.
Você no início paga muito pouco pelo valor do imóvel. Pode ser melhor
continuar no aluguel e ir poupando para dar uma entrada maior e
financiar em menos tempo, ou pagar o imóvel à vista”, observa Calado.
Já para Marcelo Prata, o fato de poder amortizar a
dívida longa antecipadamente é um fator que deve levar o comprador a
considerar um financiamento mais longo. Primeiro porque, para financiar
em um tempo mais curto (pois deu um grande valor de entrada) ou pagar um
imóvel à vista, o comprador pode ter de se descapitalizar
completamente, ficando sem qualquer reserva de emergência, o que é
bastante arriscado.
Em segundo lugar, quem poupa para dar uma entrada
maior ou pagar um imóvel à vista pode acabar sendo atropelado pela
valorização dos imóveis. “Se você financia um imóvel de 500.000 reais,
você trava aquele valor em 500.000 reais. Não tem que ficar correndo
atrás da valorização”, diz Prata.
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